Letieres Leite & Orkestra Rumpilezz

L'apparition sur la scène musicale brésilienne de l'Orkestra Rumpilezz fondé par Letieres Leite n'a pas manqué de faire sensation. Avec ses quinze cuivres et cinq percussionnistes, ce big band ne risquait évidemment pas de passer inaperçu. L'influence musicale du candomblé ou d'autres religions afro-brésiliennes a nourri l'inspiration de plusieurs générations d'artistes. Voici donc aujourd'hui, le deuxième volet de notre série où un traitement jazz est appliqué à ces musiques religieuses. Après après avoir évoqué Guga Stroeter et son orchestre HB, voici Letieres Leite & Orkestra Rumpilezz. Une évocation très à propos puisque Letieres Leite et sa nombreuse troupe viennent d'embarquer pour l'Europe où ils se produiront la semaine prochaine dans le cadre du festival Europalia...

Fondé à Salvador en 2006, l'Orkestra Rumpilezz fait souffler un vent de fraîcheur sur Bahia, lui amenant un peu de la créativité qui commençait à lui manquer, au point que cet orchestre ait été qualifié de "Vanguardia Baiana", d'avant-garde bahianaise ! Dès le premier disque, encore le seul à ce jour, la reconnaissance et l'enthousiasme pour la musique de Rumpilezz atteignaient tout le pays. Car, finalement, les Bahianais n'auront trouvé que deux façons de conquérir le Brésil entier : par la musique la plus riche qui soit, comme avec Rumpilezz, ou par la plus commerciale, avec l'axé et sa star Ivete Sangalo... Le parcours de cette chanteuse honnie des puristes mériterait d'ailleurs une attention plus soutenue : pendant des années, le chef d'orchestre de son groupe Banda do Bem et son arrangeur n'était autre que... Letieres Leite ! Je ne vais pas vous mentir, le jour où je l'ai appris, j'ai moi-même réécouté en boucle son tube "Festa" !

Avec Letieres Leite, le titre de maestro n'est pas usurpé. Mieux, il l'incarne comme peu de musiciens de sa génération peuvent le prétendre. Alors qu'il a commencé à apprendre la musique en autodidacte, alors qu'il suivait des études en arts plastiques, il a vite entrepris d'approfondir son bagage, sa formation allant jusqu'à se poursuivre au sein du prestigieux conservatoire Franz Schubert de Vienne où il passera six ans. De retour au Brésil, c'est la musique commerciale qui lui offre la notoriété. Mais tous les tubes d'Ivete Sangalo n'y pourront rien changer, il poursuit un rêve, un rêve qui résume son ambition musicale et qui le taraude depuis ses années viennoises. C'est lors de son retour au Brésil, quand il fonde, dans le quartier d'Amaralina, l'Academia de Música da Bahia, spécialisée dans l'enseignement des musiques populaires de Bahia, que vient le déclic, "c'est à ce moment-là que je suis parvenu à réunir les deux mondes, la tradition des terreiros et l'apprentissage au sein du conservatoire", explique-t-il.

Le nom de la formation qui allait incarner ce vieux rêve ne doit rien au hasard. Orkestra Rumpilezz. Orkestra avec un K, pour renvoyer à sa racine grecque. Rumpilezz parce que les trois tambours du candomblé sont les atabaques rum, rumpi et lê et que les deux Z sont ceux du jazz ! Tout un programme. Qui ne semble pas si éloigné de celui de Guga Stroeter, présenté dans la première partie de notre série Jazz-Candomblé. Tirer le meilleur de chaque monde, inventer un langage qui combine les harmonies européennes et les pulsations rythmiques afros !

Cet Orkestra fonctionne sur le mode du big band. Si les musiciens ne sont plus en smoking mais vêtus de blanc, ils ont toujours un pupitre sous les yeux et suivent les arrangements très écrits du maestro Leiteres.

Pour être exact, les influences de Rumpilezz ne sont pas seulement celles du candomblé mais plus généralement celles de l'univers percussif bahianais, entendez par là Olodum aussi bien que les sambas traditionnelles du Recôncavo. D'ailleurs, parmi les percussions, on trouve à côté des atabaques quelques timbaus, leur version profane et moderne.

A la différence des musiques de Guga Stroeter, portées par des voix venues directement des terreiros, celles de Leiteres Leite, parce qu'elles sont instrumentales, sont plus abstraites. Imaginez que vous les découvriez lors d'un blind test, vous auriez probablement du mal à en identifier la provenance. C'est ce qui est arrivé à Joe Ferla, le célèbre ingénieur du son new-yorkais : "un ami écoutait le disque, Joe qui passait par là demanda ce que c'était. Il croyait que c'était un groupe afro-cubain, puis se dit que c'était peut-être quelque chose qui venait du Nigéria. Cet ami lui a donné un exemplaire du disque et, une semaine plus tard, il se proposait pour faire le mixage". Sachant que Letieres Leite, profitant de son compagnonnage avec Ivete, a remis un disque de Rumpilezz en mains propres à Beyoncé, parce qu'il avait toujours entendu dire qu'elle avait l'esprit très ouvert en matière de musique, on se demande si elle va bien finir par l'appeler ! De l'intérêt de donner ses disques...

Pour plus d'informations sur cette formidable manifestation, dédiée cette année au Brésil, le site BossaNovaBrasil en a déjà présenté la programmation. Thierry, son auteur, s'y trouve même ce week-end pour le concert de Teresa Cristina et de la Velha Guarda da Portela : on attend son compte-rendu ! - L'Elixir du Dr. Funkathus

O músico Letieres Leite é a mais perfeita tradução brasileira do "Teorema Broadway-off-Broadway". Por que Nova York tem, ao mesmo tempo, o melhor teatro comercial dos Estados Unidos e a mais vibrante cena alternativa? Resposta: porque atores e diretores ganham dinheiro na Broadway, a mítica rua onde se situam as principais casas de espetáculo, e com isso financiam seus projetos pessoais na chamada "off-Broadway". Um fenômeno semelhante ocorre em Salvador e na área da música popular. A capital da Bahia se tornou, nos últimos anos, o centro irradiador da mais vigorosa música pop brasileira, aquela que o crítico Hagamenon Brito batizou pejorativamente de Axé Music. Ao longo da década passada, o flautista, percussionista e saxofonista Letieres Leite, hoje com 51 anos, foi o principal arranjador de Ivete Sangalo e criador da sonoridade de sucessos como Abalou a Festa, música mais executada do ano de 2002. Fez orquestrações também para Daniela Mercury e Claudia Leitte - que, com Ivete, formam a trindade pop da Bahia. Paralelamente a esse ofício na "Broadway", Letieres desenvolvia um esplêndido projeto "off-Broadway", a Orkestra Rumpilezz (ele faz questão de grafar assim mesmo, com k). Esse trabalho acaba de ganhar um reconhecimento de peso. Letieres e seu grupo são os únicos brasileiros incluídos na programação do BMW Jazz Festival, que ocorre neste mês e é o maior evento dedicado ao gênero no país nos últimos tempos - e que traz em sua programação três saxofonistas lendários, Joshua Redman, Wayne Shorter e Billy Harper, além da cantora Sharon Jones (veja mais detalhes sobre o festival na página 80).

A Orkestra Rumpilezz pode ser definida, grosso modo, como uma "big band". Mas de um tipo único: os arranjos combinam percussão brasileira com jazz, num tratamento inovador. Tal ousadia chamou a atenção dos especialistas. Só no ano passado, Letieres e seu grupo conquistaram mais de uma dezena de prêmios - inclusive o de Melhor CD de Música Popular do Prêmio BRAVO! Bradesco Prime de Cultura. "O axé é um grande laboratório , em que eu pude fazer meus experimentos com os arranjos, e eles sempre foram bem aceitos. Se você olhar o conjunto da obra de Ivete, vai ver que tem questões rítmicas complexas", disse o músico no mês passado, em entrevista a BRAVO!. "A argila com que se faz a música comercial baiana é a mesma com que eu faço a Rumpilezz, mas o acabamento é diferente." Tal frase resume a filosofia de trabalho de Letieres. Ele não é daqueles músicos que atuam no circuito comercial apenas para "ganhar dinheiro". É profissional, entusiasmado, dedicado. Considera que, com seu esforço, ajudou a elevar o nível instrumental do pop baiano. Mas seu principal interesse atualmente é mesmo a Rumpilezz - tanto que, agora que a orquestra vem conquistando reconhecimento, ele decidiu largar trabalhos mais lucrativos (incluindo a parceria com Ivete) para investir mais e mais energia em seu projeto "off-Broadway".

um sobrenome sem nome

A trajetória de Letieres é rica e peculiar. A começar pelo nome. "Meu pai é numerólogo e, quando eu nasci, decidiu que eu carregaria apenas o sobrenome da família, Letieres Leite, pois daria sorte", disse o maestro que não tem prenome. Antes de ser músico, Letieres seguiu o que achava ser sua vocação, a de artista plástico, cursando belas-artes na Universidade Federal da Bahia. Pendendo já para a música, mudou-se para Florianópolis, onde montou o seu primeiro grupo instrumental, a Banda de Nêutrons. Lá, aprendeu a tocar saxofone, instrumento no qual atingiria virtuosismo como autodidata. Acabou como diretor musical da banda brasileira Expresso Rural e com ela fez uma turnê europeia. Largou a excursão para se fixar no velho continente. Estabeleceu-se em Viena e passou no vestibular para o conservatório Franz Schubert, onde estudou jazz, além de cursar percussão num grupo formado por estudantes de várias origens, interessados nos ritmos brasileiros. "Foi lá que fiz o primeiro experimento no estilo da Rumpilezz. Passei a compor peças para sopro e tambores. Estudei a minha ancestralidade baiana para mostrar aos europeus", diz Letieres - que continuou a exercer a função de embaixador da percussão brasileira durante um período em que viveu na Suíça.

Letieres só voltou à Bahia e ao Brasil em 1994, momento em que a Axé Music ganhava dimensão nacional com a cantora Daniela Mercury. Ele fez o arranjo de um dos discos mais vendidos da cantora, Feijão de Corda, o que lhe abriu as portas para trabalhar com Margareth Menezes e com o grupo Jammil e Uma Noites - primeiros movimentos de uma trajetória que culminaria com o status de maestro oficial do pop soteropolitano. Mesmo engolfado no lado mais industrial da música baiana, o "lado b" de Letieres nunca deixou de acompanhá-lo. Ainda pairava em sua mente inquieta o desejo de mostrar às pessoas a complexidade dos ritmos afro-brasileiros. Chegou a formar uma instituição de ensino, a AMBAH (Academia de Música da Bahia), que infelizmente durou pouco tempo. Foi quando Letieres percebeu que a forma mais impactante de disseminar suas ideias sonoras era mesmo formar uma orquestra. E assim, em 2005, nascia a Rumpilezz.

Vinte músicos em forma de ferradura

O nome da banda de Letieres é inspirado no nome dos três atabaques do candomblé: o Ru, o Rumpi e o Le, cada qual correspondente a um tom (alto, médio e baixo, respectivamente). Os três, claro, estão representados no grupo. Já o "zz" veio do jazz, representado no grupo pela profusão de instrumentos de sopro. O que faz a ideia de Letieres ser original não é apenas a junção das duas vertentes, mas a forma como ela é feita, construindo harmoniosamente a ponte entre os dois estilos. É como pensar que o Pelourinho está dentro de New Orleans e nada soar estranho. Todas as composições são dedicadas a um orixá do candomblé - já que para cada um há uma batida diferente nos três atabaques. "Tenho 40 mil discos e nenhum se parece com a Rumpilezz", diz o cantor e apreciador de jazz Ed Motta, famoso por criticar veementemente a produção musical atual. Em 2007, Ed ouviu o grupo por acaso enquanto viajava pelo MySpace. Logo o baiano e o carioca se tornaram amigos, e Ed ajudou a propagar a fama de Letieres. Daí para o lançamento do primeiro disco, foi um pulo. Em pouco tempo, os 20 músicos vestidos de branco (respeitando os preceitos do candomblé), numa disposição de ferradura - ideia proveniente de um sonho de Letieres - começavam a mostrar seu talento pelos palcos de São Paulo e Rio de Janeiro. "Quando ouvi a Rumpilezz, senti algo parecido com o momento em que ouvi Led Zeppelin pela primeira vez. Aquilo me emocionou", diz Ed Motta. Quem for ao BMW Jazz Festival poderá conferir o impacto avassalador da música que comoveu o sobrinho de Tim Maia.



Letieres Leite & Orkestra Rumpilezz. BMW Jazz Festival. Auditório Ibirapuera (av. Pedro Álvares Cabral, s/n, SP, tel. 0++/11/5908-4299). Dia 11, a partir das 21h. Ingressos esgotados.
- Barbara Heckler - Revista Bravo

No panorama de big bands poliglotas existem misturas, misturebas e o híbrido de jazz e ritmos afro-brasileiros concebido por Letieres Leite e sua Orkestra Rumpilezz, que se destaca entre as fusões livres - e muitas vezes ineficazes - que se costuma ouvir de orquestras que encontram a world music. Em suas composições, lançadas no único disco da Orkestra, de 2009, há um respeito pela ancestralidade dos toques de terreiro que possibilita uma conversa viva entre Ellington e Oxum (moderada por Dorival), sem que os dois se dispersem. Portanto, como sempre, nada menos que uma sagaz receita rítmica deve ser esperada do show que a Rumpilezz faz com o craque do sax tenor, Joshua Redman, sábado e domingo, no Sesc Pompeia.

Letieres explica: "Tocamos Mantra 5 em opanijé para Omolu", diz, referindo-se ao orixá de capuz de palha, ligado à terra e à morte, cujo toque a Rumpilezz encaixa na composição do saxofonista. "Nunca imaginei que opanijé pudesse ser usado em um contexto desses. Descobri observando a melodia, os acentos e a intenção da síncopa", reflete, por telefone de Salvador, como se tivesse feito uma descoberta, não uma invenção. "O balaio de ritmos que temos por aqui, esta herança das nações do candomblé, é muito vasto. Me sinto ainda no maternal. Toco um pouco de Ketu, de Jeje, de Angola", explica, sobre as diferentes nações, ou vertentes de candomblé, cada uma com seus ritmos específicos, usados em rituais para enaltecer os orixás.

Desde que Letieres e Joshua se encontraram em São Paulo, no BMW Jazz Festival do ano passado, o maestro planeja a apresentação. "Conheço a música dele desde quando eu morei na Europa. Ele me fez o convite e começamos a trocar ideias por e-mail", conta Letieres. Os dois trocaram discos, agendaram o encontro e, há dois meses, Letieres ensaia a Orkestra para executar os arranjos para Jazz Crimes, Hide and Seek e Mantra 5, composições de Joshua Redman.

"Ele ficou curioso para fazer esse tipo de imersão na música afro baiana. Quis aprender os toques. Presta atenção nos detalhes", conta Letieres, que levou Joshua a um terreiro Jeje e fez uma tarde inteira de vivência com o saxofonista nos atabaques. "Não é fácil. Nós temos a mesma origem étnica. Viemos todos da África, mas a diáspora rítmica é muito distinta. Por isso, é bem provável que um músico de lá não consiga tocar as coisas de cá, e vice versa", explica.

Além das três músicas de Joshua arranjadas por Letieres, o show terá as composições Aláfia e Anunciação, da Rumpilezz sobre quais o saxofonista improvisa, mais ciente do mecanismo rítmico depois das imersões, dos ensaios e do show que fez em Salvador, nesta quarta-feira.

"Para nós, em contrapartida, há o contato com um músico do nível dele, pois um dos alicerces da Rumpilezz é a música improvisada", conta, sobre o brilhante saxofonista californiano que arrebentou em seus dois shows no Auditório Ibirapuera, no ano passado. Mesmo que se abra às possibilidades do jazz, é nítida, em conversa, a atenção à tradição com que Letieres projeta sua música. Quando a reportagem pergunta se o maestro pensou em adaptar alguns dos cantos dos orixás para o show, como já foi feito por algumas orquestras afro cubanas com a santeria, o candomblé caribenho, a resposta é seca: "Nenhuma melodia da Rumpilezz é ligada à religião do candomblé. Eu não tive autorização para mexer com isso. Eu apenas desconstruo e reconstruo ritmos. Se eleger um orixá como base de uma composição, tudo naquela música virá das variações rítmicas pertinentes àquele orixá", explica.

A desconstrução a que o maestro se refere é o equivalente de um quadro cubista. Os mais simples ritmos quaternários que estamos acostumados a ouvir desde o berço são entortados para formar células assimétricas, formando os tipos de ciclos irregulares que se encontram, por exemplo, nas composições do disco Time Out, de Dave Brubeck. "Mas isto é apenas teoria", diz Letieres. "O mais importante é que aprendemos cantando os ritmos, através de história oral, como todos os ritmos são transmitidos no terreiro. Foi isso que expliquei para Joshua. O jazz se escreve de um jeito, mas se lê de outro", explica.

A visibilidade de Letieres no cenário instrumental vem do respeito que o maestro tem, tanto no meio pop quanto no meio jazzístico. Ao mesmo tempo que realiza shows com Joshua Redman e toca com seu Quinteto Rumpilezz, o maestro produz discos de Mariana Aydar, Lucas Santanna, Márcia Castro, e outros. O que reforça a tese: se Letieres é um tradicionalista em seu respeito aos ritmos, sua música dialoga também com o interesse recente do público jovem por estéticas afro-fílicas, como os afrobeats e afro-sambas tão em voga em festas e shows paulistanos. "São ciclos da música brasileira", reflete. "Nos anos 60 tivemos a mesma coisa, com Baden e Vinicius. Na música instrumental, isto também já aconteceu, com a Orquestra Afrobrasileira, de Abigaíl Moura, nos anos 40", completa.

LETIERES LEITE E JOSHUA REDMAN
Sesc Pompeia. Teatro. Rua Clélia, 93, tel. 3871-7700. Sáb., 21 h; dom., 19 h. R$ 8/ R$ 32. - ROBERTO NASCIMENTO - O Estado de S.Paulo

22 de agosto de 2012 às 12h38
Joshua Redman & Orkestra Rumpilezz

Pouquinho maior que o publicado, conversa com Joshua Redman sobre seu encontro de cinco shows com a Orkestra Rumpilezz, para matéria que saiu na Folha hoje. Vídeo abaixo, riff de intro de sua composição “Hide & Seek”, que vai ganhar versão com a Rumpilezz, imagina os tambores e naipes.

JOSHUA REDMAN DESCOBRE A ÁFRICA (NO BRASIL)
Jazzista americano de 43 anos fará série de shows ao lado da baiana Orkestra Rumpilezz

Revelado no começo dos anos 90, quando se tornou um dos destaques do jazz norte-americano contemporâneo, o saxofonista Joshua Redman está no Brasil para série de shows ao lado da baiana Orkestra Rumpilezz, de Letieres Leite.
Filho do também saxofonista Dewey Redman (1931-2006), que lançou discos nos anos 70 e 80 por selos como Impulse e ECM, Joshua, hoje com 43 anos, tocará, acompanhado da orquestra de 14 sopros e cinco percussões, faixas da Rumpilezz e versões de músicas suas.
De um hotel à beira do mar em Salvador, contou sobre a experiência.

Como tem sido conhecer o som da Rumpilezz?

A experiência tem sido muito inspiradora. Encontrei o Letieres e ele me levou a um terreiro, do qual fazem parte alguns dos percussionistas da Rumpilezz. Fomos num quarto na parte de cima onde ficam os instrumentos de percussão e todos vieram e tocaram. Fiquei imerso, no meio de um batuque muito poderoso. Foi divertido e tocante e inspirador.

A formação musical sem piano ou contrabaixo deve ser uma novidade para você.

Acho que eu nunca toquei com uma banda assim – e certamente não ouvi muitas bandas assim. Especialmente não tocando música moderna.
É muito único ter uma banda onde todos os elementos harmônicos vem dos sopros. E é fantástico para mim perceber o quanto tão plenamente realizado isso é, você ouve as harmonias bem claramente.
É um testamento ao talento de Letieres. Ele tem um conceito maravilhoso e totalmente formado para essa banda. Ele obviamente pensou na forma e trabalhou em todos os detalhes, é uma estética realmente completa.
Um mundo musical único, que Letieres criou dessa tradição musical muito, muito profunda, poderosa e complexa que vem da Bahia, com os ritmos colocados em um vocabulário harmônico mais moderno, que vem do jazz e da música clássica.

A relação da Rumpilezz com a música africana é forte. Você tinha alguma experiência nesse sentido?

É totalmente novo pra mim. Isso é a experiência musical mais próxima da música africana que já tive, o mais próximo da música africana que já cheguei. Quando eu era novo minha mãe me levou a apresentações de música e dança africana, então talvez lá no fundo eu tenha isso em mim. Mas eu era bem novo, nunca estudei e certamente como músico profissional nunca tive uma experiência como essa antes. É muito estimulante, muito gratificante e território muito pouco familiar pra mim.

Hoje em dia há uma espécie de interesse renovado na música africana mais tradicional.

Não me surpreendo. Ritmos africanos são a fonte de quase toda a música americana. Certamente de toda a música popular americana. Mas as linguagens musicais se transformaram tanto que em termos da linguagem rítmica específica – no jazz moderno, no funk, no R&B – você está bem removido da fonte original. Então alguns artistas se interessam em tentar trazer mais especificamente elementos da linguagem original para aquilo que fazem.
E há tantas diferentes permutações pelo novo mundo. Na América, nos temos nossas expressões musicais de ritmos e tradições africanas que se desenvolveram. E aqui no Brasil há algo muito particular, muitas coisas diferentes, é outra tradição. É um mundo bem vasto. - Ronaldo Evangelista - Folha de Sao Paulo

A Orkestra Rumpilezz, big band criada pelo maestro Letieres Leite, venceu ontem à
noite o prêmio de melhor grupo da música instrumental e revelação do ano no 21º
Prêmio da Música Brasileira, ao unir os ritmos do candomblé ao jazz. O nome da big
banda, formada por 20 músicos, surgiu, aliás, da fusão dos três atabaques do
candomblé (Rum, Rumpi e Le) ao jazz. A orquestra baiana concorreu com o João
Donato Trio e Rabo de Lagartixa na disputa pelo prêmio de melhor grupo. E, na
categoria revelação, com Alexandre Gismonti Trio e Maria Gadú.

Sua vitória representa a síntese do sagrado e do profano, na interseção da cultura de
massa e a cultura popular. No encarte do disco "Letieres Leite e Orkestra Rumpiless", o
também saxofonista e flautista Letieres explica a forte relação de suas composições
com a música sacra do candomblé, cujo ritmo, apesar de preservado nos rituais,
ganhou as ruas e se alteraram ao influenciar vários estilos musicais. "Tanto as
composições quanto os arranjos são baseados nas claves e desenhos rítmicos do
Universo Percussivo Baiano, em que as variações melódicas procuram ser fiéis às
células rítmicas. Neste contexto, os instrumentos de sopro também desempenham um
papel percussivo."

Esse papel fica mais perceptível quando o tema da música é executado, muito mais
marcado em uma faixa, menos em outra. Muitas vezes, o maestro compõe cada música
buscando inspiração para o ritmo em uma divindade e em outra para o tema. O disco
começa com "A Grande Mãe" - seria uma homenagem à Iemanjá? - com base no toque
vassi, usado para chamar divindades de acordo com batida do atabaque Rum. Já em
"Floresta Azul", o ritmo é cadenciado para Oxossi, mas o tema foi inspirado numa
cantiga de Odé. Na música "rumpelizzada" de Ed Motta "Balendoah", também está lá o
vassi, mas tocada para Ogum.

Mas, assim como no jazz americano, que inclusive veio ao Brasil diversas vezes beber
na musicalidade de João Gilberto, Tom Jobim e Milton Nascimento, durante os solos,
a relação entre o ritmo, sons e silêncio, intensidades e alturas, a melodia alcança um
voo superior à base ao qual ela se apoia. Se a célula rítmica dita, ao longo do tema, as
variações harmônicas - e a percussão está fortemente ligada ao culto das divindades e
seus respectivos poderes de conexão com o sagrado - o solo é o próprio êxtase, o transe
completo, cuja base é regional, tradicional e religiosa, mas que se ''desterritorializa'',
numa síntese que cria um terceiro elemento.

É muito audível esse processo em "Anunciação", música em homenagem ao baterista e
percussionista Antonio Ferreira da Anunciação, pioneiro em unir o jazz à música
baiana. Nos solos, o sax alto André Becker toca jazz, mas numa malandragem
enraizada num ritmo "exótico", só para lembrar o adjetivo usado em "Native Dancer",
disco que fez os saxofones tenor e soprano de Wayne Shorter se esbaldar na voz de
Milton Nascimento e no piano de Herbie Hancock no fim da década de 70. Em alguns
momentos, é o funk em "Beauty and the Beast" ou jazz em "Ana Maria", mas ambos em
uma cozinha brazuca, mineira. E o trompetista Joatan Nascimento, também no solo da
mesma música, teria conseguido fazer Miles Davis ir além do ''fusion'', convencendo-o
a morar em Salvador. A lista completa dos premiados pode ser conferida no site
www.premiodemusica.com.br/blog.
- Lauro Lisboa Garcia, SALVADOR - O Estado de S. Paulo

A Orkestra Rumpilezz, big band criada pelo maestro Letieres Leite, venceu ontem à
noite o prêmio de melhor grupo da música instrumental e revelação do ano no 21º
Prêmio da Música Brasileira, ao unir os ritmos do candomblé ao jazz. O nome da big
banda, formada por 20 músicos, surgiu, aliás, da fusão dos três atabaques do
candomblé (Rum, Rumpi e Le) ao jazz. A orquestra baiana concorreu com o João
Donato Trio e Rabo de Lagartixa na disputa pelo prêmio de melhor grupo. E, na
categoria revelação, com Alexandre Gismonti Trio e Maria Gadú.

Sua vitória representa a síntese do sagrado e do profano, na interseção da cultura de
massa e a cultura popular. No encarte do disco "Letieres Leite e Orkestra Rumpiless", o
também saxofonista e flautista Letieres explica a forte relação de suas composições
com a música sacra do candomblé, cujo ritmo, apesar de preservado nos rituais,
ganhou as ruas e se alteraram ao influenciar vários estilos musicais. "Tanto as
composições quanto os arranjos são baseados nas claves e desenhos rítmicos do
Universo Percussivo Baiano, em que as variações melódicas procuram ser fiéis às
células rítmicas. Neste contexto, os instrumentos de sopro também desempenham um
papel percussivo."

Esse papel fica mais perceptível quando o tema da música é executado, muito mais
marcado em uma faixa, menos em outra. Muitas vezes, o maestro compõe cada música
buscando inspiração para o ritmo em uma divindade e em outra para o tema. O disco
começa com "A Grande Mãe" - seria uma homenagem à Iemanjá? - com base no toque
vassi, usado para chamar divindades de acordo com batida do atabaque Rum. Já em
"Floresta Azul", o ritmo é cadenciado para Oxossi, mas o tema foi inspirado numa
cantiga de Odé. Na música "rumpelizzada" de Ed Motta "Balendoah", também está lá o
vassi, mas tocada para Ogum.

Mas, assim como no jazz americano, que inclusive veio ao Brasil diversas vezes beber
na musicalidade de João Gilberto, Tom Jobim e Milton Nascimento, durante os solos,
a relação entre o ritmo, sons e silêncio, intensidades e alturas, a melodia alcança um
voo superior à base ao qual ela se apoia. Se a célula rítmica dita, ao longo do tema, as
variações harmônicas - e a percussão está fortemente ligada ao culto das divindades e
seus respectivos poderes de conexão com o sagrado - o solo é o próprio êxtase, o transe
completo, cuja base é regional, tradicional e religiosa, mas que se ''desterritorializa'',
numa síntese que cria um terceiro elemento.

É muito audível esse processo em "Anunciação", música em homenagem ao baterista e
percussionista Antonio Ferreira da Anunciação, pioneiro em unir o jazz à música
baiana. Nos solos, o sax alto André Becker toca jazz, mas numa malandragem
enraizada num ritmo "exótico", só para lembrar o adjetivo usado em "Native Dancer",
disco que fez os saxofones tenor e soprano de Wayne Shorter se esbaldar na voz de
Milton Nascimento e no piano de Herbie Hancock no fim da década de 70. Em alguns
momentos, é o funk em "Beauty and the Beast" ou jazz em "Ana Maria", mas ambos em
uma cozinha brazuca, mineira. E o trompetista Joatan Nascimento, também no solo da
mesma música, teria conseguido fazer Miles Davis ir além do ''fusion'', convencendo-o
a morar em Salvador. A lista completa dos premiados pode ser conferida no site
www.premiodemusica.com.br/blog.
- ROGER MARZOCHI - Agência Estado (Sao Paulo)

Big-band criada em Salvador (BA), em 2006, a bela Orkestra Rumpilezz sintetiza no nome - que costura os três atabaques do Candomblé (rum, rumpi e lé) com os dois z do jazz - o conceito que norteia seu som inovador. Que chega ao disco - numa inusitada associação da gravadora Biscoito Fino com a Caco Discos, o braço fonográfico da empresa de Ivete Sangalo - fazendo jus aos elogios colhidos entre músicos como Eumir Deodato e Ed Motta, cujo tema Balendoah é recriado pela Rumpilezz com a participação do próprio Ed. O maestro da Orkestra é Letieres Leite, hábil na fusão da linguagem do jazz com as células rítmicas do samba-reggae e com o toque dos tambores afro-baianos. Original, a mistura exibe grande complexidade harmônica neste disco gravado no Teatro Castro Alves, em Salvador (BA), por conta da boa acústica da sala. A combinação de sopros e percussão resulta imponente graças à maestria das orquestrações de Letieres Leite (que, aliás, trabalha como arranjador para Ivete Sangalo - daí o elo entre a Biscoito Fino e a Caco Discos). Detalhe: os sopros desempenham papel percussivo na Orkestra (escrita com k como no original grego). Com exceção de Balendoah, a rica composição de Ed Motta que Leiteres traz para o universo do afro-jazz, todos os temas autorais do álbum são da lavra do maestro. Inspirados pela magia dos orixás, Anunciação, Aláfia, Floresta Azul e Temporal são alguns temas que, na contramão da diluição da axé music, indicam caminhos mais complexos e refinados para a música afro-baiana... - Notas Musicais - Mauro Ferreira

Esses dois discos instrumentais, tendo a percussão como fio condutor, são perfeitos exemplos de um jazz com os pés fincados no Brasil. Lançados no fim de 2009, servem como trilha sonora para inspirar um ano realmente novo.

De Salvador, Letieres Leite & Orkestra Rumpilezz - que estreia no disco homônimo (Biscoito Fino/Caco Discos) - fundem atabaques do candomblé com grande naipe de sopros (da tuba à flauta). Liderada pelo saxofonista, compositor e arranjador Letieres Leite, a orquestra avança num terreno que teve entre seus pioneiros, nos anos 1960, o compositor, saxofonista e arranjador Moacir Santos, e no qual pouco se fez desde então. Gravado no Teatro Castro Alves, em Salvador, aberto e fechado por "A grande mãe", de Leite, o disco traz mais sete composições originais do arranjador e ainda uma bela recriação de "Balendoah", tema instrumental de Ed Motta (que participa com vocalises), que o lançou em seu álbum "Aystelum". Há também um vídeo bônus, para rodar em PC ou Mac, filmado durante uma apresentação na Igreja Nossa Senhora dos Pretos, em Salvador.

A base para a Rumpilezz - cujo nome vem da associação dos três atabaques do candomblé, "rum", "rumpi" e "lé", mais os "zz" de jazz - é o rico universo percussivo baiano, em conexão direta com a África ancestral, mas com um tratamento harmônico contemporâneo, daí também a natural associação com a praia jazzística. Entre os bons resultados dessa alquimia musical está o samba-reggae "Taboão": um naipe de trompetes apresenta o tema, os atabaques e a tuba fornecem a base e através da música alternam-se os solos de trompete (Gilberto Jr.), atabaque lé (Ricardo Braga), sax tenor (Reudes Nogueira) e sax alto (Letieres Leite). - Jornal O Globo (Rio de Janeiro)